Peças de um motor.

segunda-feira, 2 de junho de 2014

O que falta enxergar?!

   Existem duas divisões possíveis no mundo: o lado dos países que se especializaram na arte de ganhar, e o lado dos que se resignaram na arte de perder (GALEANO, 1978). Dito isto, e descendo na escala e diminuindo o zoom óptico, parece que esta lógica se repete em várias instâncias, o "empreendedor" que detém a arte (ovacionada pelo capital) de ganhar e o trabalhador (também chamado colaborador, ironia do capital para enfatizar que este apenas colabora para o enriquecimento de alguém), que se especializou na arte de servir.
  Um paragrafo sem novidade (mesmo assim seria capaz de apostar um dedo da mão direita como alguém cegamente acharia isto uma inverdade) mas que serve para distinguir os dois lados, e ainda cabe realçar que, o lado especializado em ganhar é formado por poucos e o lado resignado, por infinitos.
  O trunfo do lado que explora é ter sua exploração, por mais visível que seja, maquiada, aceita e legitimada pelos explorados, que a partir da promessa meritocrática de "você também pode", "depende de ti", correm atrás do paraíso fomentando cada vez mais a riqueza alheia com a ilusão de que pertencerão a aquele lado algum dia, ou pior e mais surreal, que já fazem parte de alguma forma.
  Interessante questionamento me ocorreu estes dias enquanto pensava no deboche que o capitalismo faz em cada coisa que nos cerca, ao passo que ele se apodera de tudo e gera lucro, nada permanece a salvo com sua pureza original por muito tempo. Pensava eu em filmes que contam histórias de revolução, se pensar bem, a maioria esmagadora destes filmes de ficção possuem os dois lados bem definidos, seja representado por apenas personagens pontuais, ou por situações mais generalizadas. O filme cool do momento, Hunger Games, (que o capitalismo não contente em vender apenas livros transformou em película) apresenta os dois lados bem definidos: a capital e sua riqueza esnobe, excêntrica e abundante; e os distritos, pobres, miseráveis, esquecidos... que apenas fornecem força laboral e matéria prima.
  A ironia da analogia com a vida real debocha abertamente de cada um de nós. Mas o incrível é que as pessoas assistem uma história assim (com os lados definidos) e sempre torcem pelo lado revolucionário, pelo mais fraco. Será porque a natureza deles lá bem no fundo, onde ainda o capital não conseguiu chegar, ainda sintam que há algo errado em apenas uns se darem muito bem em detrimento de milhões? Será pelo heroísmo de torcer pelo time mais fraco, tornando uma possível vitória épica? Será inconscientemente por saber que aquela revolução não passa de ficção e então não faz mal mudar o cenário?
  Este deboche capitalista em toda parte nos mostra o quanto estamos no lado mais numeroso e totalmente servil. A defesa do sistema pelos explorados compõe um trunfo para o lado explorador que os deixa tranquilos na sua "capital" com toda pompa. Em contrapartida eles nunca demonstram empatia pelo lado explorado, pior, ainda se dão ao direito de debochar, e fazer com que o deboche soe nos ouvidos cegos, como uma luz no fim do túnel possível a todos que se empenharem, mas que na verdade nunca chegará.


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