Peças de um motor.

terça-feira, 15 de julho de 2014

Morro acima, morro abaixo.

     Não sei bem como começou, nem quando, mas existe uma verdadeira ode a sexta-feira que paira no ar da aldeia. Fim de semana é legal, claro. Afinal que tipo de sujeito seria eu em discordar deste senso comum tão badalado?! Pera! Sou um espécime um tanto chato.
     Cada vez mais o absurdo toma conta da rotina dos indivíduos e proporcionalmente, cada vez mais há um convencimento de que tudo isto é necessário, normal. Que triste. Dai explica-se a ode a sexta-feira e o repúdio a segunda-feira, o inicio e o fim, inicio do final de semana e fim do mesmo...ou ainda, o fim da semana laboral e inicio da mesma, dois marcos amados e odiados.
     A sexta representa o ultimo gás que deve-se dar no trampo para ajudar o patrão a prosperar mais, depois disto, é só festa, descanso, pernas para cima, cerveja, sol, relax total...porque Segunda (aff), começa tudo de novo outra vez. 
     Domingo a tardinha pontualmente começa a choradeira, o fim de semana chega ao fim, a Segunda que representa a volta a rotina laboral já aponta no horizonte e com ela todo amargo da vida. Mas este amargo, este fardo insuportável é necessário, como irei pagar minhas contas?! Meu cartão de crédito usado para comprar coisas que tacitamente me disseram para comprar vai vencer, preciso pagar para restabelecer meu limite, assim não ficarei frustrado se no próximo aviso de promoção imperdível eu ficar de fora.
     O absurdo paira no ar e todos fingem não ver. Uma coisa importante a ser sempre esclarecida, apesar de me parecer óbvia, é que o sentimento de revolta e indignação com as coisas ao redor, nasce exatamente porque a pessoa também é alvo da picada, não é pretensão de criticar coisas alheias, é a intenção de a partir da revolta, se autocriticar e buscar luz nessa escura e profunda hibernação de consciência.
   O mito de Sísifo que vivemos não faz sentido algum, ou melhor, não atende o sentido que verdadeiramente gostaríamos que atendesse. Os objetivos que buscamos enquanto rolamos de segunda a sexta a pedra morro acima, não foram traçados por nós, estamos ali a mercê de algo que em determinado momento tomou as rédeas de nossas mãos, e nós tacanhamente, aceitamos. Por isso a ode a sexta-feira pois ali parece, e apenas isto, que alcançamos com êxito o cume da montanha...uma pausa pra respirar e ser rapidamente quem gostaríamos de ser (fim de semana), um breve momento de "controle", mas pera! Já é domingo a noite e a pedra balança no alto da montanha, como num ritual de deboche ela amaga lentamente descer, um balé terrível que anuncia que na madrugada de domingo pra segunda, tudo volta ao "normal" e amanhã de manhã, segunda-feira, o dia mais odiado, ela terá rolado morro abaixo e nos espera para iniciarmos a subida árdua mais uma vez, porém novamente embebidos pelo doce engano de estarmos exatamente onde deveríamos, esquecemos do sentido e seguimos fazendo a tarefa que nunca acaba, como se fosse nosso destino, como se estivéssemos felizes.

Nenhum comentário: